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Melanie
Klein, nascida no ano de 1882, em Viena, falecida em 1960 em Londres,
psicanalista, embora se considerasse freudiana, desde o início de seu trabalho
clínico mostrou excepcional originalidade, criando um novo campo teórico e
técnico na psicanálise, o que gerou, na época, inúmeras controvérsias.
O seu interesse pelos tempos iniciais do desenvolvimento psíquico levou-a ao trabalho com crianças da mais tenra idade, no qual introduziu a técnica lúdica, do brinquedo, como meio de acesso às fantasias inconscientes, uma atividade em si mesma simbólica e meio para o desenvolvimento do pensamento simbólico.
Kristeva
(2002), que escreveu sobre a relação da vida de Melanie Klein e sua produção,
mostrando suas lutas e seus lutos, diz que a clínica da infância, da psicose,
da esquizofrenia, da depressão, da mania, do autismo, dos atrasos e inibições,
da fragmentação do eu, da angústia catastrófica, entre outras manifestações que
se destacam os trabalhos de Bion, Winnicott, Tustin e outros, “seria
inconcebível sem a inovação kleiniana” (pp.18-20).
O trabalho
analítico baseado na teoria kleiniana visa alcançar o arcaico presente no mundo
mental ou, dito de outro modo, o infantil presente no adulto, as relações
pré-genitais, com as marcas do pré-verbal e
“memórias em sentimentos” (Klein, 1957/74), ampliando as perspectivas de
compreensão do mundo mental e das relações humanas, desde as angústias de
aniquilamento e sentimentos de perseguição que dominam o psiquismo primitivo,
os sentimentos de voracidade e inveja, as defesas mais primitivas, tendo como
referencial o mecanismo da identificação projetiva, importante elo nas relações
intersubjetivas, desde a relação mãe-bebê.
A pulsão
destrutiva na vida humana é profunda e amplamente observada na clínica pela
visão kleiniana, cuja técnica nos permite “ouvir o sofrimento psíquico com seu revestimento de angústia agressiva” (Kristeva, 2002, p.108).
Entretanto, considerar apenas a destrutividade é ter uma visão parcial e não integrada desta teoria que nos revela um mundo interno em “luta entre a vida e a morte”, como nos diz Steuerman (2000/2003), em dedicada análise à obra kleiniana.
As experiências da vida adulta numa análise kleiniana resgatam as primárias relações objetais (seio/mãe) e as transformam em novas relações, alcançando novas realizações. A teoria kleiniana observa desde os modos primitivos de sentir, violentos pela intrusão, aos processos de reparação, em elaboração da dor da culpa, possibilitando modos mais criativos de desenvolvimento psíquico e das relações humanas em geral.
Melanie Klein
(1957) aponta dores e ansiedades persecutórias nas experiências iniciais do
bebê e diz também que “a mais primitiva vida emocional se caracteriza por uma
sensação de perda e recuperação do bom objeto” (p.32). As experiências, no
decurso da vida, vivenciadas na posição depressiva, permitem que o eu se
reconheça agente do ódio e do amor, colocando o sujeito frente às
responsabilidades éticas e cuidados contínuos com a vida psíquica e com todo o
espectro de relações humanas.
Para concluir este pequeno texto que destaca apenas alguns aspectos da
grande obra de Melanie Klein, a psicanálise que ela nos legou ultrapassa a
ideia de fases e estágios cronológicos de desenvolvimento pela ideia de
posições - esquizoparanóide e depressiva - como disposições inconscientes que
dominam o mundo psíquico, em qualquer período da vida.
Referências:
Klein, M.
(1974). Inveja e Gratidão. Rio de
Janeiro: Imago. (trabalho original publicado em 1957).
Kristeva,
J. (2002). O gênio feminino: a vida, a
loucura, as palavras. Rio de Janeiro: Rocco.
Steuerman,
E. (2003). Os Limites da Razão: Habermas,
Lyotard, Melanie Klein e a Racionalidade. Rio de Janeiro: Imago. (trabalho
original publicado em 2000).