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Transtornos do Pânico

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Por EDA MÁRCIA PALACIN PAGLIUSO

Membro do Grupo de Estudos de Psicanálise de São José do Rio Preto e Região


 A nomenclatura “Transtorno do Pânico” se oficializa na psiquiatria desde 1980, quando passa a fazer parte do Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais da Associação Psiquiátrica Norte Americana (o DSM-III), o “Transtorno do Pânico” é também citado no Código Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (o CID-10), publicado pela Organização Mundial de Saúde. 

Vale lembrar que, na época, houve uma enorme divulgação por todos os meios de comunicação referendando a “nova descoberta” e enfatizando a possível desmistificação das questões existenciais envolvidas. As manifestações clínicas expressas pelos sintomas eram anunciadas como o resultado de uma disfunção de certas vias nervosas cerebrais de origem, provavelmente, genética. 

Portanto, de acordo com essa “nova descoberta”, o transtorno do pânico seria a expressão sintomatológica de uma disfunção de certas vias nervosas cerebrais. Assim sendo, o estudo das causas e dos mecanismos de desenvolvimento desta patologia deixaria de ter importância e o objetivo terapêutico passaria a ser a diminuição dos sintomas através da medicação e terapias cognitivo-comportamentais. 

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), o transtorno do pânico é caracterizado como ataques recorrentes de ansiedade grave (ataques de pânico) que ocorrem de forma imprevisível, e não exclusivamente em situações determinadas. Nesses ataques, alguns sintomas físicos se fazem presentes, levando o sujeito a desenvolver uma preocupação excessiva quanto ao medo da morte, de enlouquecer e de perder o controle da situação. Esses sintomas incluem distúrbios cardiorrespiratórios - palpitações ou taquicardia, sensação de asfixia, de falta de ar e sufocamento - calafrios, sudorese, tremores, desconforto ou dores abdominais, vertigem, náusea, desmaio, parestesia etc. Também 

podem aparecer sintomas como desrealização (sensação de irrealidade) e despersonalização (estar distante de si mesmo). Todo esse quadro pode vir ou não acompanhado de agorafobia (ansiedade de estar em locais ou situações das quais seria difícil escapar ou nas quais o auxílio não seria possível). 

Enquanto nas fobias a pessoa sente ansiedade em relação a um objeto externo, no pânico ela fica ansiosa frente ao que sente no seu próprio corpo. 

Na abordagem psicanalítica, os ataques de pânico são compreendidos como crises agudas de angústia avassaladora, cujo afeto é a ansiedade. A experiência é de risco de morte eminente acompanhado dos sintomas físicos descritos anteriormente. 

Porém, o objetivo do tratamento analítico não se restringe à diminuição dos sintomas, e sim a retomada do curso do desenvolvimento emocional. Compreendemos que o quadro sintomatológico decorre de uma qualidade de mente primitiva e, portanto, reativa e refratária que, habitualmente, faz uso excessivo de mecanismos de defesa que interditam a percepção e, por conta dessa precária condição, a mente carece da função reflexiva. A impossibilidade de pensar e representar (simbolizar) as sensações emocionais, leva à descarga de ansiedade por meio de identificações projetivas intensas no ambiente e no corpo. 

Habitualmente, a pessoa acometida pelo Transtorno do Pânico chega para o atendimento psicanalítico através de encaminhamento médico, geralmente acompanhada de algum familiar. Ao relatar suas crises, não reconhece desencadeantes ambientais ou intrapsíquicos, não consegue entender o que está acontecendo, desconfia das avaliações médicas, relaciona seus ataques a algum problema cardíaco ou doença muito grave. Com frequência, desde a primeira crise, busca auxílio através de idas a Pronto Atendimento, consultas médicas e uma extensa bateria de exames, sempre com o intuito de receber ajuda para sanar tamanho sofrimento. Portanto, o desamparo e a busca para ser atendido é evidente. 

Compartilho da hipótese sobre a compreensão da função comunicativa (mesmo que inconsciente) das manifestações sintomáticas dos ataques de pânico como um sinal de alerta para que o sujeito possa receber cuidados. 

Tenho observado, ao longo da minha experiência clínica, que o TP funciona como uma espécie de divisor de águas sobre o histórico de vida do cliente acometido que, pelo sofrimento psíquico e pelos recursos vitais, busca, através do tratamento analítico, reavaliar e ressignificar a própria vida, sendo que importantes mudanças ocorrem frequentemente no processo. 

Os ataques de pânico deflagram o desamparo psíquico humano mesmo que, inicialmente, ainda não exista essa percepção por parte do analisando. 

Vale lembrar a importância do diagnóstico diferencial que necessita ser realizado com extremo cuidado. Fatores constitucionais e transgeracionais devem ser considerados. 

O uso de psicofármacos pelo especialista é indicado quando o sofrimento provocado pelo excesso de ansiedade interfere na qualidade de vida do sujeito. Essa medicação poderá, em alguns casos, com o tempo, ser retirada. 

Cabe ao analista estimular o analisando com o intuito de despertar interesse e curiosidade pelo que acontece no seu mundo interno, sensibilizando-o para o poder das fantasias, das emoções, das defesas e dos sentimentos. 

A experiência analítica oferece uma oportunidade ímpar de conhecimento da atuação do infantil, muitas vezes com qualidade perversa, cravado na mente do sujeito. Através do trabalho da dupla, torna-se possível desvendar fantasias e defesas disruptivas. 

Quando esse conjunto de fatores se viabiliza, acontece a “escuta analítica” – o trabalho naturalmente se volta para encontrar significados e retomar o curso do desenvolvimento emocional. Assim, é possível que o analisando encontre formas mais criativas para não só expressar como também fazer um bom uso da sua sensibilidade, percepção e sentimentos. 

A psicanálise destaca a importância das relações iniciais do bebê com o objeto primário, denominadas “Relação Primordial” e compreende que, possíveis falhas nesta vinculação podem gerar um desenvolvimento psíquico deficitário, ou seja, um ego frágil e desamparado na sua capacidade de abrigar e sustentar vivências emocionais. Vale lembrar que Freud considera o desamparo como condição intrínseca do bebê humano ao lado da importância e da necessidade de um 

outro que possa garantir sua sobrevivência, desenvolvimento biológico e emocional. 

Para a psicanálise o assim chamado “Transtorno do Pânico” passa a ser a expressão possível da incapacidade de se apropriar subjetivamente do desamparo inerente à existência humana. O confronto com a verdade da precária condição de não termos garantia e conhecimento do que pode nos acontecer ao longo da vida é insuportável para um ego imaturo e, portanto, frágil que, diante dessa constatação, se desespera e regride, passando a sinalizar, através dos sintomas, a necessidade de ser auxiliado para que possa retomar o curso do seu desenvolvimento emocional. Entendemos também que essas manifestações sempre estiveram presentes na experiência humana. 

O manejo clínico psicanalítico tem como objetivo a construção de um vínculo verdadeiramente empático, portanto, vivo e afetivo que, pela sua continência, passa a gerar confiança fazendo com que a dupla possa adentrar um percurso de investigação, conhecimento e desenvolvimento mental. 

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